As arquitetas e designers esquecidas da Bauhaus
Cem anos após a fundação da Bauhaus, uma importante escola de arquitetura e artes aplicadas, descobrimos grandes designers e arquitetas que ficaram no esquecimento. Essas mulheres, em sua maioria emancipadas e com vocação artística, se matriculavam atraídas pelo centro educacional mais progressista de sua época.
As promessas de igualdade lidas nos folhetos publicitários da época nada tinham a ver com a verdadeira atitude dentro da escola. Ela era bastante ambígua por parte dos professores, somada à invisibilidade e à falta de reconhecimento público de seu trabalho.
Como prova disso, muito se escreveu sobre os grandes artistas da Bauhaus, como László Moholy-Nagy, Mies van der Rohe, Paul Klee ou Wassily Kandinsky. Mas, ao contrário, muito pouco se escreveu sobre o trabalho das mulheres que também estudaram e criaram na Bauhaus e que só são lembradas como suas esposas.
As artistas da Bauhaus eram mulheres modernas e, devido ao seu modo de vida, romperam com o papel tradicional das mulheres da época. Elas usavam cabelos curtos, calças compridas, iam ao cabaré, ouviam jazz e eram donas da sua própria sexualidade.
Conhecidas como ‘melindrosas‘, eram o protótipo da mulher moderna que as jovens da Alemanha assumiram, exportada para a grande tela graças ao cinema mudo americano. A Primeira Guerra Mundial levou as mulheres a deixarem as suas casas para ocupar os cargos deixados pelos homens recrutados para o front. Com isso, elas foram capazes de acessar esferas que, anteriormente, lhe eram negadas.
Em reconhecimento ao seu trabalho e à contribuição destas vanguardistas no desenvolvimento do design e da arquitetura, selecionamos algumas delas.
As arquitetas e designers esquecidas da Bauhaus: Friedl Dicker
Uma das primeiras alunas a se matricular na Bauhaus e talvez uma das mais brilhantes que passou pela escola. Já dentro da Bauhaus, ela formaria junto com Franz Singer, Anny Wottitz e Margit Tery, o conhecido grupo dos “vienenses” (um grupo de alunos vindos da escola de arte de Viena).
Ela dedicou o seu tempo na Bauhaus a oficinas de encadernação, tipografia e têxteis, fazendo fantoches e litografias. Recebeu uma grande influência de Paul Klee, que em 1920 passaria a fazer parte do corpo docente da Bauhaus.
Infelizmente, quando Dicker deixou de frequentar a Bauhaus, ainda não havia concluído os seus estudos, pelos quais não recebeu nenhum tipo de diploma. Isso não impediu o seu gênio criativo, desenvolvendo uma carreira brilhante em vários campos, como arquitetura, design de móveis e ensino.
Em Viena fundou junto com Franz Singer um estúdio de arquitetura, tendo o dualismo como eixo criativo de seus projetos. Eles desenvolveram um grande número de projetos arquitetônicos e de design.
Marianne Brandt
Graças a uma exposição que a Bauhaus realizou em 1923 para mostrar o talento de seus alunos, Marianne descobriu a existência desta escola. Nesse mesmo ano, ela se matriculou na Bauhaus para se aprofundar no design. Lá, ela desenvolveu o seu talento até 1929, época em que provou ser mais hábil do que a maioria de seus companheiros homens.
O seu talento a levou a colaborar com o estúdio Walter Gropius, além de deixar um notável legado de objetos de design. Os seus projetos se destacam por serem objetos práticos e úteis para o uso diário, mas sem descuidar da estética, produzindo algumas das melhores peças da história da Bauhaus.
Desde luminárias a jogos completos de café e chá, os seus designs, de uma marcada tendência moderna e vanguardista continuam a ser comercializados, inspirando muitas outras peças atuais.
As arquitetas e designers esquecidas da Bauhaus: Anni Albers
Annelise Fleischmann ocupou o cargo de diretora da oficina têxtil, substituindo uma grande referência da escola, Gunta Stölzl. Anni iniciou os seus estudos na escola em 1922 com a firme intenção de se tornar pintora. Mas em pouco tempo ela descobriria, graças aos fios e retalhos de sua oficina têxtil, que poderia fazer grandes obras de arte com esses materiais.
A sua grande habilidade nesta área permitiu que ela se tornasse, anos depois, a primeira mulher e artista têxtil a expor os seus trabalhos em uma exposição individual no MoMA de Nova York.
Os seus anos na Bauhuas foram gastos experimentando novos materiais, como o celofane, o que lhe permitiu criar um novo tecido reflexivo que absorvia o som. Antes de terminar os seus estudos na escola, ela se casou com o jovem professor e seu ex-aluno Josef Albers.
Com isso, eles formariam um dos casais artísticos mais importantes do século XX. Após o triunfo dos nazistas e sua chegada ao poder, fecharam definitivamente a Bauhaus em 1933. O casal emigrou para os Estados Unidos, país que os acolheu e lhes deu a oportunidade de continuar desenvolvendo uma obra artística muito importante.
Anni Albers dominou os teares duplos e o jacquard, começando assim a conceber murais e tapeçarias em grande escala com designs abstratos impressionantes e espetaculares.
Ise Gropius
Conhecida por muitos como a Sra. Bauhaus, carinhosamente chamada assim pelo seu próprio marido, Ise Gropius desembarcou na Bauhaus pouco antes da exposição de 1923. Ela se casou com Walter Gropius alguns meses depois da exposição. O casamento teve como testemunhas Kandinsky e Paul Klee.
A partir daí, Ise trabalharia com determinação na consolidação da escola, apoiando o trabalho de Walter. Ela desempenhou tarefas de organização, edição e secretaria da Bauhaus.
Quando Walter Gropius decidir renunciar ao cargo de diretor da escola, ela se tornou coautora de grande parte de seus textos, artigos e palestras. Esse trabalho sempre foi reconhecido pelo marido enquanto ele continuou vendendo ensaios para editoras na Alemanha e no Reino Unido.
Graças a esse trabalho, ela alcançou relativo reconhecimento, o que não foi suficiente para publicar o seu artigo “Grandma Was a Career Girl”. A revista americana The Atlantic Monthly rejeitou a sua publicação porque promovia a “ideia espantosa” de mulheres trabalhadoras.
Como vimos na maioria dos casos, os nomes dessas artistas ficaram à sombra de seus companheiros homens e suas peças foram atribuídas à “Bauhaus “.
Além disso, o reconhecimento do seu trabalho veio muito tarde, mas podemos dizer que, de um modo geral, conseguiram construir o seu caminho. Esta é uma pequena contribuição para o seu reconhecimento.